As sociedades empresárias são aquelas que exercem atividades econômicas e organizadas para a produção ou circulação de bens ou de serviços, bem como possuem atividade organizada e profissional, patrimônio especificado, finalidade lucrativa e identidade social¹.
Dependendo do ramo da atividade, tamanho da empresa e interesses do empresário, existem diferentes tipos societários, influindo diretamente na condução do negócio, tais como na forma de realizar deliberações internas, distribuir lucros, efetuar o pagamento de tributos, entre outras questões.
Neste ponto, destaca-se que as sociedades empresárias se subdividem em (i) sociedade em nome coletivo; (ii) sociedade em comandita simples; (iii) sociedade limitada; (iv) sociedade anônima; (v) sociedade em comandita por ações e; (vi) Eireli.
As sociedades anônimas (também chamadas de companhias) possuem diversas peculiaridades em relação aos demais tipos societários, como a divisão de seu capital social em ações. Vejamos o disposto nos artigos 1º e 2º, da Lei nº 6.404/76:
“Art. 1º A companhia ou sociedade anônima terá o capital dividido em ações, e a responsabilidade dos sócios ou acionistas será limitada ao preço de emissão das ações subscritas ou adquiridas.
Art. 2º Pode ser objeto da companhia qualquer empresa de fim lucrativo, não contrário à lei, à ordem pública e aos bons costumes.
§ 1º Qualquer que seja o objeto, a companhia é mercantil e se rege pelas leis e usos do comércio.
§ 2º O estatuto social definirá o objeto de modo preciso e completo.”
Sendo assim, as companhias devem pautar suas atividades em conformidade com o previsto na Lei supramencionada, observando as suas peculiaridades que as diferenciam dos outros tipos societários.
Consoante o disposto no art. 159, da Lei nº 6.404/76, a companhia poderá ingressar com ação judicial em desfavor de seu administrador para reparar danos causados pelo mesmo, mediante prévia deliberação pela assembleia geral:
“Art. 159. Compete à companhia, mediante prévia deliberação da assembleia-geral, a ação de responsabilidade civil contra o administrador, pelos prejuízos causados ao seu patrimônio.”
No entanto, conforme se depreende do recente julgamento do Recurso Especial nº 1778629/RS, pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a aprovação da assembleia para promover o ajuizamento da demanda impacta na capacidade da companhia estar em juízo.
Logo, segundo o entendimento do STJ, a demanda pode ser proposta sem que haja a prévia aprovação da assembleia geral, devendo tal irregularidade ser sanada no decorrer do trâmite processual. Vejamos a ementa do recurso:
“RECURSO ESPECIAL. DIREITO EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL. SOCIEDADE ANÔNIMA. AÇÃO REPARATÓRIA CONTRA EX-ADMINISTRADORES. AUTORIZAÇÃO DA ASSEMBLÉIA GERAL. ART. 159 DA LEI 6.404/76. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO AFASTADA. POSSIBILIDADE DE SANAÇÃO DA “LEGITIMATIO AD PROCESSUM”. ART. 13 DO CPC/73. PRECEDENTE ESPECÍFICO.
1. A nulificação do acórdão recorrido por afronta ao art. 398 do CPC/73 depende da destacada influência do documento tardiamente acostado para a fundamentação da decisão que se pretende desconstituir.
2. Plena a ciência da parte em relação ao teor do referido documento, pois a ata de assembleia fora por ela própria assinada.
3. A ação social reparatória (ut universi) ajuizada pela sociedade empresária contra ex-administradores, na forma do art. 159 da Lei 6.404/76, depende de autorização da assembléia geral ordinária ou extraordinária, atendidos os requisitos legais. Precedente específico.
4. Em se tratando de capacidade para estar em juízo (legitimatio ad processum), eventual irregularidade pode vir a ser sanada após o ajuizamento da ação, impondo-se que se oportunize a regularização na forma do art. 13 do CPC/73.
5. Caso concreto em que a ata da assembleia, dando conta da autorização, foi acostada aos autos, demonstrando-se a capacidade para estar em juízo e, assim, permitindo-se o prosseguimento da ação reparatória.
6. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.
(REsp 1778629/RS, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/08/2019, DJe 14/08/2019)” (destacamos)
Feitas essas breves considerações, diante dos recentes precedentes judiciais, as companhias poderão ingressar com ações judiciais em desfavor do seu administrador em momento anterior à deliberação na assembleia geral, o que agilizará a discussão judicial e a reparação dos danos causados pela má gestão do negócio.
No entanto, em que pese a possibilidade do prévio ajuizamento da demanda, ressalta-se a necessidade de realizar a assembleia geral durante o curso do processo e de juntar sua ata aos autos no decorrer dos trâmites processuais, sanando tal irregularidade.
Carlos Eduardo Maranhão Santana
Advogado, pós-graduando em Direito Empresarial na Fundação Getúlio Vargas – FGV/SP
¹Referências: MAMEDE, Gladston, Manual de direito empresarial – 13. ed. – São Paulo: Atlas, 2019, p. 4-5.