Nos últimos meses, decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF) têm afastado a obrigação de beneficiários de planos de saúde devolverem valores referentes a tratamentos custeados por força de liminares judiciais, mesmo quando essas decisões são posteriormente revogadas.

       Os fundamentos adotados nas decisões envolvem análise da boa-fé, da natureza essencial do tratamento e da função das tutelas provisórias no processo civil.

       No âmbito do STJ, nos Recursos Especiais nº 2.155.581/BA e nº 2.165.479/RJ, a Terceira Turma examinou ações em que operadoras de planos de saúde buscavam o ressarcimento de valores pagos em cumprimento a decisões liminares.

        Em ambos os casos, o Tribunal afastou o dever de reembolso com base na inexistência de dano indenizável, nos termos do art. 302 do Código de Processo Civil, tendo em vista a ausência de demonstração de má-fé por parte dos beneficiários e o fato de os procedimentos terem respaldo técnico e indicativo de urgência no momento da prestação. 

     No Recurso Especial nº 2.155.581/BA, a operadora buscava reaver valores pagos para internação hospitalar autorizada por liminar, posteriormente revogada com a extinção do processo sem julgamento do mérito. O STJ entendeu que, diante da efetiva necessidade do tratamento e da ausência de ilicitude na conduta da beneficiária, não há fundamento para a restituição dos valores. 

     No Recurso Especial nº 2.165.479/RJ, discutia-se a devolução de quantia paga para fornecimento de medicamento não registrado na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), com base em decisão liminar. O registro do medicamento ocorreu posteriormente, durante a tramitação do processo. A Terceira Turma concluiu que a exigência de devolução, diante das circunstâncias concretas, prescrição médica, boa-fé da parte autora e cumprimento de decisão judicial válida, não era juridicamente exigível.

     No Recurso Especial nº 2.165.479/RJ, discutia-se a devolução de quantia paga para fornecimento de medicamento não registrado na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), com base em decisão liminar. O registro do medicamento ocorreu posteriormente, durante a tramitação do processo. A Terceira Turma concluiu que a exigência de devolução, diante das circunstâncias concretas, prescrição médica, boa-fé da parte autora e cumprimento de decisão judicial válida, não era juridicamente exigível.

     Em sede constitucional, a Segunda Turma do STF, ao julgar o Recurso Extraordinário nº 1.319.935/SP, também afastou o dever de reembolso em caso análogo. No voto do relator, ministro Edson Fachin, destacou-se o princípio da irrepetibilidade, afirmando que “o segurado do plano de saúde está isento de devolver produtos e serviços prestados em virtude de provimento jurisdicional”, sendo esse entendimento aplicado em razão da natureza essencial do tratamento médico e da boa-fé no recebimento dos serviços.

      Outros precedentes recentes reforçam a mesma linha de decisão, inclusive em cortes estaduais, como o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Nessas decisões, os fatores comuns identificados são a inexistência de conduta dolosa ou fraudulenta por parte dos beneficiários e a atuação sob amparo de decisões judiciais válidas.

      Advogados que atuam tanto em defesa de operadoras quanto de beneficiários têm reconhecido que as decisões seguem lógica similar à do princípio da irrepetibilidade dos alimentos: valores pagos em razão de decisões judiciais válidas, para fins essenciais, não são passíveis de restituição, salvo se houver comprovação de má-fé.

   Essas decisões vêm sendo fundamentadas na proteção da segurança jurídica, da confiança legítima gerada por decisões judiciais, bem como no papel das tutelas de urgência no sistema processual.

     Embora ainda não haja tese fixada em sede de repercussão geral ou recurso repetitivo que vincule os tribunais em definitivo, o Judiciário vem decidindo, com frequência, nesse mesmo sentido.

        A equipe do Setor de Partido Privado da Farracha de Castro acompanha atentamente a consolidação dessa jurisprudência, promovendo reflexões técnicas sobre os impactos dessas decisões nas relações entre consumidores e operadoras de planos de saúde.