Fonte: IBDFAM – Acessado em: 15/03/2019

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a morte de quem contratou crédito consignado não extingue a dívida. O pagamento deve ser feito com parte da herança deixada pelo devedor ou, se já houver sido realizada a partilha, pelos seus herdeiros, no limite do valor transmitido.

No caso, três herdeiros, em embargos à execução, pediam a extinção da dívida contraída pela mãe falecida, composta por contratos de crédito consignado em folha de pagamento. A sentença julgou procedente o pedido formulado na petição inicial, reconhecendo a extinção da dívida conforme solicitado pelos irmãos. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), porém, aceitou a apelação do banco credor, que havia pedido o pagamento do débito através da herança.

Em recurso especial, os herdeiros assinalaram uma possível violação ao artigo 16 da Lei 1.046/50, que trata da extinção da dívida após o falecimento. A lei também aborda sobre o crédito com desconto em folha para servidores públicos e civis, pensionistas, juízes, parlamentares e militares. Os filhos da falecida também alegaram que o imóvel herdado não poderia ser penhorado porque eles vivem nele.

Mas, de acordo com o entendimento do STJ, a Lei 8.112/90 revogou a Lei 1.046/50, inclusive suprimindo indiretamente as regras do consignado para servidores. Portanto, a previsão que garantia a hipótese de extinção da dívida não pode mais ser aplicada. E não sendo possível tomar o bem herdado nesse caso, nada impede que outros bens respondam pela dívida.

A relatora, ministra Nancy Andrighi, quanto à impenhorabilidade do bem de família, destacou que a matéria já foi tratada pela Terceira Turma estabelecendo que a aceitação da herança implica na responsabilização pessoal, dentro dos limites legais. Assim, não sendo possível o alcance do bem herdado, nada impedirá que outros bens respondam pela dívida.

Decisão acertada

Para o advogado Rolf Madaleno, diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), a decisão está adequada, sendo justa tecnicamente e do ponto de vista do Direito das Famílias e Sucessões.

Antigamente, pela Lei 1.046 de 1950, estava previsto que a morte do servidor público dispensaria o pagamento do empréstimo consignado em folha de pagamento. Mas na lei posterior, a 8.112/90, não se trata mais a questão dessa maneira. Assim, a questão técnica é atinente ao tema em si, já que uma lei revoga a outra.

Já do ponto de vista do direito das famílias, ele diz que a decisão faz sentido porque é uma dívida que o devedor tem, e não tem motivos para perdoar uma vez que há bens na herança para quitar o débito.

“Não faz sentido, nos dias de hoje, o Estado pagar as dívidas que o morto deixou em aberto. Pode ser que os herdeiros da falecida não precisassem quitar, mas ela pode ter deixado bens que permitiriam a quitação desses recursos. Só não paga se faleceu e não deixou bens. Agora, se deixou bens, os herdeiros herdam aquilo que respeita a herança, aquilo que ele deixou, subtraindo as dívidas”, destaca o advogado.

Para exemplificar a questão, Rolf Madaleno fala da hipótese de o falecido ter deixado uma herança de 300 mil reais e uma dívida de 100 mil reais. Nesse caso, o débito deve ser pago com os bens, então os herdeiros ficariam com apenas 200 mil reais. A dívida é extinta se o morto não deixou nenhum bem, mas se ele tiver deixado ela deve ser paga.

“Os herdeiros são responsáveis pela dívida, no montante da dívida e segundo as forças da herança. Mas eles não precisam pagar com o dinheiro deles, pessoal. Eles pagam apenas com o dinheiro da herança, quando há bens para que isso seja viabilizado”, afirma.

Direito real de habitação

Nos autos, os três filhos da falecida disseram que não podiam vender a casa, pois eles moram nela. Assim, esbarra no direito real de habitação e a moradia não responde como termos de penhora para dívida. Mas a casa não ser penhorada não tem nada a ver com a quitação da dívida.

“Pode ser que não existam bens para serem penhorados, mas a dívida precisa ser paga com os bens do falecido. E um dia, quando os herdeiros também vierem a falecer, a casa não terá mais o direito real de habitação, e aí servirá para a quitação da dívida se não estiver prescrita”, finaliza.